Por conta de um engano na hora de voltar para casa, a colegial parando em um bairro perigoso e distante, ela acaba presenciando um assassinato em um beco. Como se a morte de um desconhecido e a adrenalina não fossem o bastante, também há a questão do homicida ser uma pessoa que a pobre garota conhece bem.
Não sabendo a quem correr, a jovem decide confiar o que viu a Getúlio.(Originalmente seria um conto - digo, isso daqui É -, mas o fim dele deu uma margem para uma continuação que a autora ainda está escrevendo no Wattpad :D Para quem quiser dar uma olhada, só clicar "FIM")
Antecipação
―
Raimunda? – Ouço minha mãe dizer no outro lado da porta. Não a escutei tomar
banho no chuveiro até agora. – Quando vai sair, filha? Hoje é dia de ir para a
escola!
―
É isso que você quer? – Meu pai a acompanha, a voz se alterando depois de cinco
minutos. – Ficar presa em seu quarto, tentando cabular aula que nem uma...
Fecho meus olhos com força. Tenho o celular em
meu colo e eu seleciono os números enquanto escolho em qual devo confiar nesse
momento. Meu quarto está escuro, pois não quero que ninguém na rua perceba que
posso estar em casa.
― Mãe, só
diz que eu estou doente... – Digo sem muita força.
― Mentir
para a escola? – A voz dela se exalta. – Você nem está doente, menina!
― Talvez
tenha acontecido algo ontem? – Meu irmão caçula se faz ouvido e um silêncio
ocorre como se meus pais tivessem prendido a respiração. – Quero dizer,
geralmente ela chega só de tarde, mas como foi no ônibus errado...
João Paulo tem o dom de ser compreensivo ás
vezes. Embora tenha a mania de me incomodar, está mais quieto que o usual. Como
esperasse me questionar.
― Oh! –
Posso até imaginar que minha mãe aflita com as possibilidades. E que meu pai
está tenso, pois não tem muito tempo para ficar na porta do meu quarto. Tem
trabalho. – Será que no meio disso, ela ter experimentado algo? Drogas... Ter
sido es...
― Mãe. – Interrompo antes que
interpretassem o absurdo. – Aconteceu nada comigo... Por enquanto, nada. Eu só
não quero ir pra a escola hoje, tudo bem?
Pausa.
― Quando é
que você pretende sair desse quarto? – Mamãe está mais calma.
― Acho que
pode ser logo. – É o que digo, mas, de verdade, não sei se vou precisar só de
dias fora do contato com meus colegas de escola.
Mal dormi desde que vi aquela cena no beco,
o cabo da arma apontada para a cabeça daquele adulto que não pude
identificar... Caramba. Apenas vi aquilo
por ter pegado o ônibus errado, o qual levava para um bairro bem distante do
qual eu residia.
Fui obrigada a correr ao reconhecer o
assassino irritado com minha presença, além de seus olhos castanhos estarem em
um brilho quase morto. O coração batia forte no meu peito e as minhas mãos
suavam enquanto ouvia passos apressados atrás de mim. Era noite, fazia frio e
àquele horário minha presença não deveria estar ali. Algumas pessoas haviam
presenciado, mas não sei se eles entendiam a gravidade que era a situação.
Com certeza, não entenderiam. Havia um cara
com uma arma escondida no seu casaco com capuz, caçando alguém que presenciara
seu crime. Nem consegui raciocinar em nada, apenas o instinto de sobrevivência
aceso. “Corra, garota, corra mais rápido!”, era o que este gritava. Por sorte,
o trânsito estava intenso e minha mente possuía uma habilidade – talvez pela
adrenalina, nunca sei – em escolher o instante certo para cruzar a avenida e
esconder-me ao lado de um lixão cheio de sacos de lixo.
Ainda bem que existiam alguns obstáculos no
caminho para despistá-lo e fazê-lo ficar parado por uns poucos minutos ao olhar
para o movimento dos veículos, além de tantas sombras perigosas cercando as
ruas. Segurei minha respiração, receosa que ele viesse me perceber, mas o
assassino fora embora ás pressas. Um carro de polícia vinha de uma determinada
direção, notando algo peculiar no individuo.
Uma mulher magra e morena se encontrava na
janela de um apartamento que dava uma vista para o beco. Pelo roupão vermelho
que vestia, presumi que fosse ir dormir. Senti a mim mesma lacrimejar quando
notei sua vista sob minha cabeça e, apenas com isso, entendi que ela havia
visto a cena toda. Tinha um cigarro na sua mão direita.
“Vá ali”, apontou para a praça do outro
lado da rua, “e você vai ver um homem velho com barba grande e uma gorra
colorida na cabeça. Não é difícil de achá-lo. Chamam-no de ‘Mercador’ e ele vai
levar até onde é sua casa”.
Foi difícil de responder. Levei tempo para
fazê-lo. “Mas como... Como posso confiar que vocês não vão fazer nada comigo?
Quero dizer... Minha mãe diz que não devo confiar em estranhos e...”
“Mas aquele menino”, ela franziu a testa ao
me cortar, desviando o olhar de mim, “não era estranho para você. Senão, ele
não teria te chamado. E você não estaria tão assustada como está agora”
Silenciei-me com aquela afirmação. Havia sim
o escutado gritar meu nome, dizendo para que eu voltasse porquê “tudo estava
bem” e que “ele não me machucaria”.
Só que nada estava bem. Nada está bem. Não
está.
Por isso, eu apenas olhei para baixo e
respondi nada. Meu peito subia e descia, diante da possibilidade que tinha em
enfrentar outra ameaça.
“Eu sei que é difícil, mas confie em mim”,
quando ergui meu queixo, a moça estava me encarando. “Vai dar certo por que o
‘Mercador’ vai pedir um preço pelo seu bom serviço e ele pode fazer o que você
quiser por esse relógio”.
Meu foco se deslocou para meu pulso direito.
“Ela não podia estar falando certo”, foi o que eu pensei quando senti meu
coração pesar. Era um objeto antigo, mas era um banhado em ouro com algumas
pecinhas de cristal bem pequenas.
“Não posso...”, fechei a outra mão sob o
relógio, acariciando-o triste. “Ele pertencia ao meu avô. E é muito raro
encontrar um desses hoje em dia e os ponteiros nem estão bem...”
“Querida, sei o quanto um relógio é valioso
para o mercado quando eu vejo”, a mulher afirmou com um sorriso que não tive
certeza se era realmente simpatia por mim, “E este é um modelo esgotado do
século passado da Alemanha. Com alguns ajustes básicos e ver o comprador certo,
poderia ser vendido a preço de uma mini fortuna”
Fiquei tentada ao ouvir aquela informação,
mas sacudi minha cabeça.
“Mas...”, não queria deixar aquela memória
para longe de mim.
“Olha, garota, o que é mais valioso pra
você?”, a moça parecia impaciente, “Ficar com esse relógio velho ou voltar sã e
salva pra casa?”
“Viver, é claro”, respondi com relutância,
desviando o olhar para a rua. Demorou muito para que eu concentrasse minha
vontade para sair do beco. “Meus pais estão preocupados comigo...”, sussurrei
para mim mesma.
“Ah, mais uma coisa que eu esqueci de
dizer!”, a estranha alertou animada quando pisei para fora das sombras, “Não
esqueça de especificar bem como você quer ir! Se você dizer que quer só ir para
casa, ele pode interpretar da maneira que ele quiser”
Não entendi bem o que ela quis significar
com esse aviso, mas tratei de fazer exatamente como havia me explicado.
Encontrei o homem sentado entediado em uma caixa com roupas de hippie. Quando
fui fazer o pedido, sentindo calafrios pelo que a mulher havia informado,
tratei de especificar que não queria nenhuma ameaça à minha vida enquanto isso
ou depois disso. E que queria ir de modo salvo.
Graças ao conselho daquela mulher, acabei
perdendo meu relógio para os olhos ambiciosos daquele velhinho, mas voltei bem
para casa. Uma chuva ocorria no meu bairro e minha família me recebeu furiosa
com os braços abertos. Mas não conseguia dormir com a imagem do olhar do
assassino – e, cara, a sua voz, aquela
voz que me lembrava ter ouvido... – da minha cabeça de maneira alguma.
Porquê hoje é sexta-feira e ainda tenho que
ir para a escola. Mas sinto incapacitada de ir por saber que meus amigos não
entenderiam o perigo que passo agora. O quanto minha vida foi bagunçada por
conta de presenciar um tiro. Por conta disso, meus braços não param de tremer e
eu me encolho nos lençóis como uma criança.
Meu pai já foi embora, levar meu irmãozinho
para um colégio diferente do meu, e minha mãe desistiu de bater na minha porta.
Segundo meu despertador, são nove e alguma coisa da manhã agora... Daqui a
alguns minutos, será a hora do lanche...
Estou sozinha e preciso de alguém. Tenho um
segredo na minha garganta e não posso tê-lo para sempre. Vou ter que correr o
risco e me contatar com uma pessoa, mas ter bastante cuidado para que ela não
esteja próxima do assassino e que ele perceba que estou fazendo um movimento.
“Mas quem, meu Deus, quem?”, pego meus cabelos e os puxo de leve, movendo meu
corpo de frente pra trás como uma cadeira de balanço humana.
“Não sei o que está acontecendo”, mordo meu
lábio inferior, pegando em minha testa ao analisar. “Achei que essa pessoa
fosse tão doce... Fiquei com ela por um bom longo tempo e ela nunca demonstrou
aquele tipo de comportamento... Além disso, quando ele me lançou aquele
olhar... Tive a impressão de ver um mons...”
Meu olhar para na tela do telefone, próximo
de meu pé, e isto me mostra um número. Devido minha paranoia com tudo, havia
descartado o celular que uso desde o ano passado. Quebrei o chip, procurei
nervosa entre a pilha velha de coisas que mantinha em uma caixa mofada e
encontrei um celular bem antigo. Estou usando o chip agora, o qual testei nesta
madrugada com um primo de outra cidade que não tinha contato com meus amigos.
“É perfeito”, tento me tranquilizar com o
plano. Nenhum dos meus amigos de escola tem esse número, pelo menos os quais
tenho mais preocupação. Mas sei de algumas poucas pessoas com quem o assassino
não fala por não gostar muito, então... Encaro o despertador e espero sentada na
minha cama, olhando minha estante de livros e mangás.
Quando são nove e meia, sei que o sino havia
tocado e as portas estão sendo abertas para os alunos lancharem. Sei que o
assassino participa do meu grupo de amigos e imagino o quanto eles devem estar
ligando para o celular que eu usava, não para este aqui. Nenhum dos meus
colegas sabe do meu número de casa, então, estou salva, pelo menos, até a aula
acabar.
Por isso, minha vida – e provavelmente de mais gente – depende de uma única pessoa, a qual
eu nunca pensaria que poderia contar até agora. Ela não lancha com os amigos
que tenho agora, vai para um caminho separado e é o individuo que mais se
enquadra em uma emergência dessas. O tal do mauricinho que chamam de...
― É você,
sua metida a delinquente? – Ouço a voz cínica de Getúlio soar como música em meus
ouvidos, embora eu ache que ele é um dos maiores palermas da Terra por enganar
minha melhor amiga a namorar consigo para que ganhasse uma aposta ridícula. –
Qual é de faltar aula justo hoje? Você não era assim...
Mas honestamente, tenho tempo para reclamar?
É talvez minha única chance...
― Oi, geleia
de moleza. – Rolo meus olhos ao tentar manter minha voz baixa. – Tenta não
falar alto. Preciso falar com você sobre um negócio sério e somente com você.
― O.K... Por
que você está sussurrando? – Ele parece estar me estranhando. Ouço o barulho de
várias vozes se distanciando de onde ele está. Getúlio está se deslocando. – Ou
melhor, por que eu tenho que ficar
sussurrando?
― Continue
só a sussurrar. – Retruco seca, irritada por estar gastando minutos das minhas
possíveis últimas horas de vida. Que escolha sacana! – Você tá vendo Henrique
por aí? – Eu ia deixar essa pergunta e ver se Getúlio responderia, mas, no segundo
seguinte, sinto um tapa de realização e corro para dizer. – Mas se ele estiver
aí, não fique encarando ele... Encare normal... Como o seu “eu insensível”
normal...
― Meu “eu
insensível” normal? – O outro parece ultrajado. – Que conversa é essa?
― Responda e
eu te dou dez pratas. – Saio das cobertas, finalmente sentindo energia
circulando no meu cérebro quando encostei-me à parede perto da porta.
― Dez
pratas... É pouco, mas é dinheiro. Então, tá valendo... – Escuto o garoto
bufar, como não tivesse outra opção. Sorrio grata a mim mesma pela negociação.
– Eu vejo sim. Mas, fala aí, o que você quer? Vocês eram tão ‘pombinhos’ há
pouco tempo. Ele fez alguma coisa? Sempre achei que não fosse tão santinho...
Respiro fundo. Ainda estamos próximos de meu
ex-namorado de duas semanas atrás e o cara ainda fica falando algo assim? Vai
ver se o Henrique não é um gênio do mal?
― Espere que
ele vá para o andar térreo do nosso prédio. Fique aonde você está. – Digo a ele
com seriedade. Mesmo não gostando muito de Getúlio, quero ele vivo. – E, ah,
continue sussurrando... Não quero que o pessoal daí nos entenda...
― Por que
isso? – Sinto a inquietação dele. – O que foi que aconteceu entre vocês?
― Getúlio...
Você pode não acreditar em mim, mas... – Fechei meus olhos, concentrando
apreensão em minha voz depois de suspirar. – Eu vi Henrique matando um cara. Eu quero que você me ouça e fique
completamente calmo.
FIM?
QUER
PARTICIPAR DO FEITO A MÃO? TEM ESPAÇO PRA VOCÊ! ENVIE SEU CONTO PARA
CONTATONRA@GMAIL.COM OU PUBLIQUE SEU DESENHO/POEMA NO NOSSO TUMBLR! QUEM
SABE NA PRÓXIMA SEMANA NÃO É VOCÊ RECEBENDO OS COMENTÁRIOS!
Nenhum comentário:
Postar um comentário