Banner Submarino

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

[LEITOR CONVIDADO] Segredo

O conto de hoje foi enviado pela leitora Amanda Cunha (lembram dela? A autora de Conto de Férias) e conta a história de Emily Bloom, a garota com a misteriosa habilidade de descobrir segredos!
Bora conferir?


Emily Bloom era o tipo de garota da qual todo mundo queria distância. Não porque não fosse bonita, ou tivesse alguma doença contagiosa; não. Muito era dito a seu respeito, e algo se sobressaía: ela era estranha.  
            Não estranha do tipo nerd, nem gótica, nem neurótica. Ela não se vestia de um jeito incomum, nunca tinha feito ninguém chorar, não usava drogas e passava as tardes como qualquer garota normal passaria. O que a diferenciava?
            Talvez seu talento único de descobrir segredos.
            A menina sabia de tudo, de alguma forma. Quando passava nos corredores, todos se calavam, com medo de serem expostos ao ouvido de radar de Emily Bloom. Havia inúmeras especulações: ela tinha delatores, tinha câmeras em todos os vestiários e armários, tinha grampeado todos os telefones da escola. Sabia até dos podres dos professores, e do diretor. A escola era sua.
            Tudo começou na sétima série, quando Emily contou ao professor de álgebra que seu amigo Collin tinha colado na prova. Isso não era tão difícil de descobrir, mas logo em seguida ela avisou Jordan Bane que o time de futebol planejava expulsá-lo. Houve vários casos de traição, obviamente. Kayla e Liam, Iris e Oliver, e sempre tinha um terceiro membro envolvido. Não importava quem fosse, ela sempre sabia.
            Começou a ficar mais sério no ensino médio. Emily literalmente ameaçou o professor de História no meio da aula, porque ele estava considerando uma prova surpresa desnecessária. Disse que ligaria para Mary, a mulher dele, e contaria o que ele realmente andava fazendo nas noites de quinta. O professor ficou pálido, e só então todos tiveram certeza do poder de Emily.
            Ela não era fofoqueira. Ninguém a contava nada. Mas ela sabia, sempre.
            Apesar de seu poder, Emily Bloom era triste. Ninguém nunca suspeitaria, mas da ponta das suas botas de caminhada até o último fio de cabelo castanho, ela se sentia extremamente solitária.
            Então, veio o garoto novo.
            Tom Smith era apenas outra vítima, ou era o que todo mundo pensava. Ninguém o avisou para ficar calado enquanto ela passava. Ninguém disse para evita-la. Na verdade, Tom não tinha sido muito notado desde o primeiro dia de aula. Vestia camisas de banda e o cabelo era sujo e bagunçado. Ia da escola para casa e fazia todos os deveres. Passava noites em claro jogando vídeo game e baixando músicas. Não falava com ninguém a não ser que falassem com ele.
            Eles se encontraram na biblioteca. Emily estava sentada sozinha na única mesa com lugares sobrando, porque ninguém queria sentar perto dela. Lia um romance qualquer de garotas. Tom carregava imensos livros de história, mais a sua mochila, e desabou na primeira cadeira vazia que viu, por acaso, bem ao lado dela.
            Logo percebeu seu erro. Inúmeras cabeças se voltaram na sua direção. Emily levantou os olhos do livro e o encarou, surpresa, notando sua existência pela primeira vez.
            -O quê? – Tom estava subitamente com calor. – Tem algo de errado com essa cadeira?
            -Tirando o fato de que é bem ao meu lado... – ela disse, meio insegura. Não falava com ninguém na escola desde o primeiro ano.
            Ele não pareceu entender. É novato, Emily percebeu. Ela se perguntou se agarrava aquela chance ou se o alertava das consequências de serem amigos. Mas o que é isso, ele só queria um lugar para sentar, pelo amor de Deus. Não estava jurando eterna lealdade nem nada.
            -Pode sentar aí, eu já estava de saída... – ela se apressou em guardar suas coisas e poupá-lo das fofocas posteriores, mas derrubou seu livro no processo e os dois se abaixaram para pegá-lo ao mesmo tempo, o que causou a colisão das duas cabeças. Emily recuou, soltando uma reclamação de dor, e viu que Tom ria.
            -Desculpe... Meu nome é Tom.
            Não podia ser, ela pensou. Impossível. Não.
            -Emily – ela sussurrou. Havia várias pessoas cochichando agora, ela podia ouvir. Abaixou a cabeça e pegou o livro discretamente.
            -É impressão minha ou você não é muito popular por aqui? – Tom perguntou, notando a inquietação na biblioteca.
            Emily deu um sorriso que poderia ser considerado de desculpas.
            -A maioria das pessoas me evita – admitiu.
            -Por quê?
            Essa era a pergunta de um milhão de dólares.
            -É... Meio... Complicado – ela sentiu que corava.
            -Sempre é complicado.
            Tom sorriu quando disse isso, e Emily notou que seus olhos tinham a cor do café preto que ela tomava toda manhã a caminho da escola. Emily adorava aquele café, assim como adorou ver os olhos dele piscando agora.
            Então contou a ele sobre os segredos, sobre seu talento, sobre o medo que causava nas pessoas. Mais do que isso, admitiu que odiava tudo aquilo.
            -Não é culpa minha saber de todas essas coisas – ela disse, mas ao mesmo tempo em que falava notou o quanto aquilo soava ridículo, e suspirou. – Eu só... Constantemente... Me encontro no lugar errado, na hora errada. E descubro algo.
            -Interessante. – Tom tinha ficado sério durante toda sua confissão, sem tirar os olhos de Emily.
            -Não é um talento, é... Mais uma maldição.
            -Entendo.
            Emily parou de falar e o encarou muito séria.
            -Ok, eu vou embora. – E pegou seus livros.
            -O quê? – Tom riu e segurou seu braço. – Não vai não. Vai ficar aqui e me dizer por que deixa sua vida ser afetada por esses idiotas da escola.
            Ela não teve resposta. Sentou novamente, se sentindo cansada.
            -No início, eu tentei ajudar – sussurrou. – Queria fazer amigos, essas coisas. Mas as pessoas começaram a ficar com raiva. E depois, com medo. Agora simplesmente me evitam.
            Tom não conseguia parar de rir.
            -Emily... Eu não te conheço a dez minutos, e já acho você incrível. Mas não seja tão ridícula.
            Isso a fez arregalar os olhos.
            -Sabe, eu poderia revelar seus segredos mais íntimos e causar sua humilhação social completa...
            -É uma pena, já que meu segredo mais íntimo provavelmente é que... Eu jogo vídeo game de cueca.
            Emily não conseguia acreditar na própria sorte. Ela deu uma gargalhada que fez a bibliotecária lhe lançar um olhar feio.
            -Agora, falando sério – ele se inclinou na sua direção. – Isso aqui só vai durar mais dois anos. O resto da sua vida vai ser diferente. Sua maldição pode ser bem útil, no futuro. Grandes empresas vão brigar por você.
            Enquanto ele falava isso, ela imaginou esse futuro. Não parecia tão ruim.
            De relance, viu o relógio da biblioteca que indicava que devia ter chegado em casa quase uma hora atrás. Emily levantou com um pulo, e Tom a seguiu.
            -Eu realmente... – ela não sabia como se despedir. Na verdade, não queria. Ficar ali conversando com aquele estranho que zombava do seu talento parecia muito melhor do que qualquer alternativa.
            -Já tem que ir? – ele pareceu até triste. Mas começou a pegar as próprias coisas, esquecendo-se da pilha de livros.
            -Preciso ir pra casa – ela riu. – Você vai fazer o quê, me seguir?
            Tom colocou a mochila nas costas e fingiu pensar por um minuto.
            -Sim, se não for muito incômodo. – Sorriu. – Quem sabe você consegue descobrir algum segredo obscuro meu. Tipo que eu sou um vampiro.
            -Argh, não! Chega de vampiros! – Emily riu. Ela não ria assim fazia muito tempo. Os dois saíram da biblioteca juntos, rindo, deixando muitos alunos confusos para trás.
            Tom acompanhou Emily até a esquina da sua casa, já que morava na outra rua. Eles se falaram na escola todos os dias depois disso. Emily guardou os segredos de todos daquele dia em diante, e nunca mais tentou ajudar. E, felizmente, nunca descobriu nada obscuro sobre Tom, a não ser o detalhe da cueca. Ele era um cara sem segredos. O único segredo que surgiu, depois de meses sendo amigos, era que Tom gostava de Emily, muito mais do que antes. E como sempre, Emily, de alguma forma, descobriu.
            A boa notícia? Ele era correspondido.

           


Quer ter seu conto ou texto postado aqui na NRA?
Envie seu material pra gente no contatonra@gmail.com

Comente com o Facebook:

3 comentários:

  1. achei essa historinha tão tão bonitinha <3 parabéns, Amanda :))

    ResponderExcluir
  2. Muito bacana essa história

    Beijos
    @pocketlibro
    http://pocketlibro.blogspot.com

    ResponderExcluir
  3. Mas que história fofa, Amanda! <3 Amei mesmo!
    Quem dera se nós tivéssemos esse poder de descobrir os segredos alheios... Ia ser assustador, mas bem bacana né?
    Adorei o final! Amor correspondido é a maior alegria do mundo, fala sério! Hahaha

    Beijinhos! www.primeiro-livro.com

    ResponderExcluir