[LEITOR CONVIDADO] Rascunhos de Guardanapo

O texto de hoje foi enviado pela mineira Maria Tereza Guedes, blogueira de 19 anos que encontra um refúgio nas palavras. Pra espalhar seu talento e convidar mais leitores pro seu blog pessoal, ela mandou esse texto INCRÍVEL pra gente! Vamos conferir?

MARIA

Maria nasceu chorando. Melhor, berrando.  Começou a odiar o mundo ali, quando a empurraram de sua aconchegante e quentinha caverna para aquele lugar barulhento e frio. Não gostou nem um pouco do modo agressivo e indiferente que a trataram naquela sala, mas mesmo assim decidiu não reclamar e ficar com os olhos fechados. Não queria incomodar. Eram várias mãos, e sentiu como se fosse uma bola de beisebol numa partida de semifinal. Já estava sentindo uma leve fraqueza quando a entregaram à mãos macias, num colo com cheirinho de violeta e erva-doce. E ali, no meio daqueles braços do grande ser de olhos verdes sentiu toda a paz e segurança que aquele novo mundo podia oferecer, e então resolveu ficar por ali mesmo. Maria cresceu e aprendeu a chamar aquele colo erva-doce de “mãe”.  Maria via sonhos no céu, até que lhe disseram que as nuvens não eram de algodão, que era pura água vaporizada. Maria nunca mais olhou para o céu, nunca mais quis sonhar tão alto.

Quando aprendeu a ler, Maria não queria mais fazer outra coisa. Lia nove livros por semana. Sentia conforto nas palavras. Maria adorava números, adorava o jaleco do professor Getúlio. Achava graça em como ele tinha uma letra tão bonita no quadro e de como, com aquela idade, ainda tinha interesse em escrever com diversas cores de giz. Maria ganhou quatro canetas em gel por tirar as melhores notas, aliás, a única a ganhar canetas de Tio Get. Escreve com uma dessas canetas até hoje na faculdade de Ciências Contábeis. Pobre Maria, tem na caneta um orgulho tão grande. Ninguém entende muito porque Maria faz contabilidade. Ela gosta tanto de palavras, chega a ser prolixa. Mas Maria também adora o mundo dos números. Ela sempre diz que os números é uma linguagem universal, que a matemática é uma ciência que não tem exceções e “poréns”  “talvez” e “se”. Quando Maria tinha 15 anos esperava ansiosamente os 17, queria entender muito sobre moda, unha, cabelo, sonhava em ter dotes artísticos. Hoje Maria tem 18 anos, está perdendo seus fios de cabelos por ser muito ansiosa e se preocupar demais com o desempenho na faculdade. Não frequenta salão de beleza, não pinta muito as unhas, e não entende nem de moda nem de maquiagem. A única vaidade que Maria tem é com a própria organização. Maria se tornou uma criança com orgulho de estar conseguindo ser adulta, só que uma criança compulsiva por livros, por musica, e por números.

TPSUNI

Enfim, eu nasci. Chamo-me Tpsuni,porque assim decidi. Tpsuni é o ser que pulsa intensamente em mim, vibrante, corajosa, apaixonada. Tpsuni vive. Tpsuni ama. Tpsuni é. Tpsuni me encobre durante a noite e me permite ser tudo que preciso, sem contas a prestar. Eu me vejo com disposição para o que me faz bem, mesmo que não seja moral nem ético. No entanto, eu sou o ser que se esconde no corpo que me envolve, eu quero amar, e sua moralzinha de merda me amordaça, eu quero ser feliz e sua eticazinha tacanha me segura. Tpsuni é o meu lado verdadeiro, minha essência desconhecida. E todas as noites Tpsuni entra em minha casa me possui com ardor, diz que me ama e que não pode viver sem mim. E a- mato todos os dias, e todas as noites ela ressuscita, para me mostrar o que não devia.

UM CERTO ATRASO

Dedico esse TEXTO à todas as pessoas interessantes que um dia eu quis escrever algo e não consegui.

Porque tantas coisas já aconteceram depois que comecei a escrever essa carta. Já conheci tantos lugares, tantas pessoas. Já vi e senti tantas outras. E só agora consegui terminar. É certo que tive que atualizar algumas informações. É claro. Desde que comecei a escrever eu vivi. E como vivi. Eu não fiquei em um sótão escuro enquanto lá fora as estações passavam.

 Apaixonei-me dezenas de vezes, e fui amada. Agora amar, meu amor..Ah! Isso foi um luxo só seu. Depois de você, todos os outros passaram a ser os outros que não eram você. E no meio de todos os vestígios que você deixou, sabemos que uma pessoa como você, não merece um coração inteiro. "Se eu tivesse a força que você pensa que eu tenho, eu gravaria no metal da minha pele o teu desenho". Lembra-se disso? Era para durar. E você e suas velhas histórias estragaram tudo que construí. E construí, diga-se de passagem, sozinha. Não estou na minha melhor fase, fato que rouba toda minha poesia.  Mas aqui estou eu, com um certo atraso é certo, mas não me esqueci de dizer que aquilo que um dia eu diria são palavras que nunca serão ditas. Acho mesmo que preciso sentir algo, o dia a dia está esgotando minhas palavras. Estou em crise. Vivendo as emoções de outros num desespero de que tudo faça parte de mim. Nunca desejei que a lua fosse minha. Nunca sonhei alto demais. Tudo que almejo é aquilo que faz parte de todos nós. Vou conquistando algumas e perdendo outras, como se o espaço não fosse suficiente.

Deve existir algo em mim que está ocupando todo o espaço desnecessariamente. Eu deveria há muito tempo ter domado essa minha mania de reciclar. E agora sinto falta de alguém como chiclete, que não precise que eu segure. Que simplesmente esteja ali, sempre colado em mim, sem que eu tenha que me preocupar se ao lavar as roupas ele não tenha se perdido. 

Maria Tereza Guedes