Ser irmão mais velho ou irmã mais velha não é nada fácil, principalmente quando os caçulas são vidas complicadas de explicar. Os pais ficam ocupados e, de vez em quando, você banca uma espécie de vigia.
Bom, acompanhe conosco em um pequeno drama de um primogênito! :)
Responsabilidades de nascer primeiro
Minha
irmã é uma pilantrinha com cara de bebê.
Espera. Ela é um bebê – um ano e seis
meses, um cheiro gostoso em sua pele rosada e um sorriso no rosto – assistindo
a um programa do Discovery Kids. Mamãe não está por perto, então ela toma toda
a liberdade de navegar (literalmente) pelo berço de lençóis dourados.
Ela
seria uma gracinha se não tivesse puxado a minha orelha por eu ter pegado uma
boneca das mãos dele. Digo, ela quase ia arrancando a cabeça da minha Barbie.
Por alguma razão, acho que ela gosta do meu brinquedo da infância. Só que não
posso deixar a loira nas mãos dela. Por que acho que o “amar coisas” da minha
irmã é um tanto dúbio.
Haja
paciência.
Não
posso ver o episódio novo de Guerra dos Tronos até minha mãe voltar.
E
cara, como minha mãe demora no banheiro! Não é a toa que tem tantos produtos de
beleza no armário de lá. Ou que aquele lugar feda a flores (bom, não é bem um
fedor, mas você me captou).
Ainda
ouço o barulho da água escorrendo pelo chão, além do ruir das gotas da chuva
que ocorre lá fora. Também há os ventos. Invadindo o sétimo andar como bruxas
em companhia de fantasmas. Fazendo aqueles sons sobrenaturais como se algo invisível
estivesse furioso com a gente.
A
televisão não deveria estar ligada, acredito. Mas meu pai – quem agora saiu não
sei pra onde – tinha me dito para a deixar assim para distrair a ‘Mandioquinha’.
Que depois que ela acorda, despertada de seu sono sagrado, a criaturinha
rechonchuda chora por atenção ou pro alerta. As coisas são muito sensíveis para
ela. Parece que qualquer coisa a faz chorar e pouca coisa faz ela se acalmar.
Entre
as coisas que fazem minha irmã se acalmar, tem o programa dos trens falantes. Sei
que trens falam, mas parece que ela não. Quando vemos algum noticiário onde
apareça um trem, minha irmã fica com os olhos brilhantes a espera do trem
falar. É muito difícil explicar de onde os colegas dela surgiram, imagine
explicar que os programas do Discovery Kids são fantasia. Por isso, fico com
minha boca quieta.
Pelo
menos, ela não pôs baba no vestido que eu fiz com tanta dedicação na máquina de
costura. Não gosto muito de Barbies, mas costumava experimentar os vestidos
delas para poder fazer uns outros. Ficavam nem um pouco bonitos porquê não
tinha muita técnica com o negócio de ser artesão. E nunca considerei que
Barbies fossem dignas para serem modelos, porquê elas tem aquelas pernas tão
enormes e também tem aquela desproporção toda.
Ainda
me pergunto por que tanta mulher quer ser magra como essas Barbies.
Vai
entender.
E
caso você me perguntar sobre eu estar generalizando as coisas, pondo até a mim
na categoria ‘mulheres’ e que sou hipócrita, aí vai uma revelação. É uma das
razões pelas quais meus pais não me deixam ter a boneca que eu quero – não uma
Barbie, mas sim daquelas lindas de porcelana (ou de uma madeira com um monte de
detalhes) com aqueles cabelos bonitos. – ou até acham que eu sou uma pessoa sem
salvação.
Sou
um garoto de uns treze anos.
Não
sou homossexual (e sim, eu sei o que é homossexual e pretendo nem ouvir a mesma
explicação que meus professores deram quando um pai de um colega meu me chamou
disso). Não visto vestidos. Ou saias. Ou coisas com babados, exceto aqueles
trajes de nobres de época em festas de carnaval ou halloween. Só sou um menino
que gosta de desenhar, costurar e fazer vestidos, blusas e saias para bonecas.
Talvez
a maior influência para mim fazê-las seja um antigo vizinho dos meus pais
quando eu tinha uns seis anos, um homem de uns trinta anos que fazia e vestia
bonecas com materiais que dava forma com as próprias mãos. Ele fazia umas
coisas legais, que pareciam meninas de verdade. Acho que já vi ele fazendo
bonecos colecionáveis com roupas de época, também.
Já
agora poderia estar fazendo alguma coisa ou então ver Guerra dos Tronos, mas
sinto um pouco de tédio. Ficar sentado, vendo esses trens falante e ouvir minha
irmã apontar pra um e outro – e eu dizer “Amanda, tenta ficar sentada, senão
você vai acabar caindo se forçar muito a grade do berço” antes de dar uma explicação
–, além dessa chuva... Me dão certo sono.
É
melhor ir pra meu quarto.
Mas,
ah, espera, tem minha mãe. Não quero deixar minha mãe com raiva.
A
mulher parece estar com os nervos de um cão furioso quando ela começa a bronca.
Continuo
a ficar aqui por alguns minutos. E então me viro para minha irmãzinha.
Ela
tem os olhos azuis curiosos sob a tela. Posso até deduzir que ela quer saber de
tudo. Saber porquê a tela tá aqui, porquê os trens falam ou até mesmo o que tá
rolando. Não falo a linguagem dos bebês, mas acho que ela tá em um processo
mais filosófico do que eu.
Ela
tira a chupeta (porquê ela só sentiu vontade de tirar) e já procura por algo.
Tem uma tiara vermelha com laço nos cabelos loiros rasos dela. E os dedos dela
são tão pequenos. E o nariz dela parece esculpido.
—
Que tá rolando, Amanda? — digo meio preocupado (ela quer fazer côco? Ela quer
fazer xixi? Ela quer mamar?), chegando perto dela. — O que você quer?
Apesar
dela ser uma pilantrinha e uma menininha bem travessa, não posso deixar de me
preocupar. É algo além de mim. Ela é pequena, ela mal fala e ela é minha irmã
caçula. Segundo o que ouvi escondido de meu pai e de minha mãe – por quê meus
pais escondem um montão de coisas e acham que eu não tenho maturidade pra essas
coisas –, “ela quase morreu” por quê ela chegou antes do que o médico previu.
Tinha
um risco dela nascer morta. Durante um tempo, era o que meus tios disseram. Que
ela não ia nascer bem. Mas acabou que ela tá aí, curtindo a vida mais doidada
do que um dragão da China.
Amanda
me lança os olhos primeiro. Já questionadores. Então abre a boca, meio
desesperada, e fala:
—
Mamá?
—
Mamá não tá aqui. — e aponto na direção do banheiro antes dela bater na grade.
—
Mamá! — desta vez, não é uma questão: é uma demanda, ela quer mamãe.
No
segundo seguinte, ela põe o dedo perto da boca pra chupar.
Estranho
que Amanda já esteja com fome. Faço uma careta, mas então chocalho minha
cabeça.
—
Tudo bem. — suspiro. — Seu irmão vai ver se Mamá tá aqui, tudo bem?
Acho
(não acho, eu sei) que ela não me entendeu, mas ela não pareceu se importar.
Fui
logo bater na porta do banheiro do quarto dos meus pais, onde mamãe tomava
banho.
—
Manhê! — chamo alto. — A Amanda quer mamar!
—
Quê? — faz a mulher, antes de desligar o chuveiro, pegar a toalha e ir me
atender.
—
Ela tá meio aperreada agora. — digo a ela. — Acho que ela tá com fome.
Minha
mãe dá um olhar na direção da menina e depois olha pra mim.
—
Morfeu, — ela me diz. — não dá para você trazer a mamadeira que tá na
geladeira?
—
A com leite? — pergunto, pois sei que mamãe tem dificuldade de dar o próprio
leite direto do peito. — Dá sim. — comento, vendo-a se aproximar da minha irmã
e Amanda abrir bem os bracinhos para receber o abraço da nossa mãe.
Viro-me
para ir à cozinha.
Parece
que vou ter que dar um jeito de baixar Guerra dos Tronos pela internet.
FIM!
Quer ter seus contos publicados aqui na NRA?
Envie seu material pra gente no contatonra@gmail.com!
Oie Larissa =D
ResponderExcluirBelo texto! De uma forma bem delicada explorou vários temas complexos.
Parabéns!
Beijos e um ótima semana;***
Ane Reis.
mydearlibrary | Livros, divagações e outras histórias...
@mydearlibrary
er, aqui é a Lucie, mas acho que posso dar oi à Larissa -q
Excluirvaleu :)
parabéns pra ti também :3
HAHA, mas que liindo o texto Lucie! E bem fofo, aliás hahaha. Parabéns!
ResponderExcluirobg, anônima (HAHAHAHA) :)
Excluirfoi um texto meio do nada, mas enfim
valeu <3
que fofoo *---*
ResponderExcluirobrigada, Aylana :))
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