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Terminando a postagem dos três textos vencedores do concurso cultural 'Aconteceu no Halloween', AGOOOOOORA~
*tambores*
Veremos o primeiro colocado! Com vocês, CHEIRO DE MORTE, de Nicole Vieira Fabri!
CHEIRO DE MORTE
AUTORA: NICOLE VIEIRA FABRI
PRIMEIRO LUGAR NO CONCURSO CULTURAL 'ACONTECEU NO HALLOWEEN'
Como filha do meio eu tinha obrigação de consolar
minha irmãzinha mais nova, Beatrice, mas não deveria esperar nada da mais
velha, Francesca.
Eu desempenha meu papel da melhor maneira que
conseguia, até mesmo quando papai ficava bêbado, eu desempenhava o papel de
mamãe e levava tapas no rosto. Era o meu papel afinal de contas. Mamãe havia
ido embora, seu corpo estava no quintal, enterrado, era só cavarmos para
confirmarmos isso.
Nunca cavamos, é claro. Até essa noite.
"Trinta de Outubro, meninas, sabe o que isso
significa?"
Eu e Beatrice nos entreolhamos. Como sempre, os
pensamentos de Francesca demoraram a se cruzarem com os meus.
“Vocês são duas tapadas”
Mais tarde Francesca esperou até nosso papai cair de
bêbado e levou a mim e Beatrice para o quintal. A roseira estava linda. Logo
embaixo da terra, provavelmente nossa mãe alimentava aquelas rosas vermelhas...
É um pensamento estranho que algo tão belo quanto rosas brancas possa se
alimentar de um corpo em decomposição.
Francesca se afastou e voltou trazendo uma pá.
“Vamos revezar” Ela disse “Cada uma cava um pouco,
menos Beatrice, é claro. Ela é muito nova”.
Minha irmãzinha me olhou de um jeito nervoso. Eu não
queria que ela chorasse, por isso lhe ofereci o sorriso mais tranquilo que
consegui. Já a Francesca ofereci um olhar indagador.
“O que?” Ela perguntou. “Você sabe, daqui a pouco.
Daqui a pouco os portais vão estar abertos”.
Não consegui argumentar quanto a isso. Quem eu era
para dizer que quando desse meia-noite os mortos não iam estar no nosso mundo
físico?
“Temos que nós apressar” Francesca colocou a pá na
terra, próximo do canteira de rosas. “Falta menos de uma hora”.
Então destruímos o canteiro, arrancando as rosas pela
raiz. Beatrice chorou, ela adorava ficar brincando ali por perto, procurando
insetos ou fingindo que estava em uma floresta. Isso porque eu nunca havia lhe
dito que era bastante provável que o que alimentava aquele lindo canteiro era a
mulher que a embalava antes de dormir todas as noites, mesmo quando seu rosto
estava inchado de tanto apanhar.
Beatrice disse adeus ao canteiro, e até mesmo recolheu
algumas pétalas e guardou no bolso de seu pijama.
Eu e Francesca transpirávamos em bicas, mas minha irmã
ao contrário de mim parecia motivada por algo. Quanto mais ela cavava mais
forte ela parecia ficar. Em dado momento disse que eu era lerda, pegou a pá da
minha mão e resolveu terminar o trabalho sozinha.
Mesmo no escuridão da noite, pude perceber que seus
olhos estavam excitados, quase frenéticos.
Enquanto ela cavava, minha mente saiu dali. Me lembrei
que há dois meses atrás, Francesca, havia me dito o que desejava fazer. Na hora
não achei que fosse verdade, mas quando a vi cada vez mais empenhada em suas
pesquisas, uma parte minha ficou animada. Quem sabe desse certo? Não tínhamos
muito a perder afinal.
Mas era assustador pensar que logo visualizaria minha
mãe destroçada pelos vermes do tempo... Ela havia desaparecido há um ano, seu
corpo não deveria estar em um estado muito apresentável.
Só voltei ao presente quando vi algo branco em
contraste com a terra marrom.
Beatrice começou a chorar. Ela era uma menina muito
sensível e apesar da pouca idade, no fundo ela sabia certinho o que estava
acontecendo.
A mão branca faltando metade do dedo indicador e com a
carne marrom feia exposta, não assustou Francesca, pelo contrário: ela riu de
um jeito nervoso e se jogou de joelhos na cova rasa. Usando os dedos cavocou a
terra macia com delicadeza, como se tivesse medo de machucar nossa mamãe morta.
Aos poucos o cadáver se revelou. Eu achei que iria ser
pior. Claro que não era bonito, aquela mulher sem globos oculares, com partes
dos ossos expostos, a carne fedorenta e apodrecida.... Mas parte minha
conseguiu visualizar minha mãe por cima daquela coisa terrível.
Francesca tomou o esqueleto com partes de carne fétida
nos braços.
“Mas o que...”
A voz de papai fez os hematomas do meu rosto
latejarem. Instintivamente coloquei Beatrice atrás de mim, e só então olhei
para ele. Sua boca estava aberta, o queixo muito caído. Por um instante, pensei
que ele estivesse surpreso, que não fizesse ideia de quem era o cadáver, mas
então sua expressão se modificou.
Ele parecia um demônio furioso. Estava mais zangado do
que quando eu havia me atrasado 10 minutos depois da sair da escola, e ele
havia me chamado de vagabunda ordinária e me dado um tapa.
O cheio de álcool que vinha dele, me dava vontade de
vomitar.
“Papai, vamos embora” A voz de Francesca surgiu,
alegre. “E mamãe vai conosco. Que horas são Lydia?”
Demorei um tempo para perceber que a pergunta era
feita a mim. Olhei para o meu relógio de pulso, que Francesca havia me feito
colocar.
“Meia-noite e cinco”
“Mamãe?” Beatrice choramingou, me fazendo ter um
sobressalto. Será que... Não, minha irmãzinha estava se referindo a mim.
“Mamãe?” Dessa vez o choramingar veio de Francesca.
Papai nos olhou de modo ameaçador.
“Suas putinhas”.
Ele babava. “Eu disse para não mexer nesse canteiro, não disse?”
“Papai, se essa noite der errado... “Francesca sorria.
“... coloque meu corpo em baixo de rosas vermelhas, tá bom?”.
Papai rugiu. E partiu pra cima da minha irmã mais
velha. Meu coração disparou e desse vez fui eu que choraminguei. Não, eu
gritei.
“Mamãe!”
Francesca e o cadáver foram ao chão. Papai começou a
dar chutes, ora na minha irmã, ora no corpo morto de mamãe.
A seguir tudo aconteceu como um borrão. A pá, meu
grito, o grito do meu pai, o líquido vermelho espirrando no meu rosto. Acho que
acertei em alguma veia importante, porque o sangue espirrou quente e
escorregadio. Talvez a pá suja de terra tenha feito um corte em seu pescoço,
talvez tenha quebrado o quebrado, mas não olhei muito tempo para papai.
Me abaixei ao lado de Francesca.
Seus dentes brancos estavam vermelhos e ela sorria.
“Você fez a sua parte, achei que não teria coragem,
mas você fez o sacrifício”.
“Mas o que...”
Ela riu, e isso a fez tossir sangue.
“Nada é de graça Lydia. Uma vida por outra”.
Então o cadáver de nossa mãe começou a ter espasmos. E
ela se levantou.
Seu cheiro, não era como eu me lembrava.
FIM
Encerramos as postagens dos vencedores! A todas as três autoras, parabéns e agradecimentos pela participação! :)
E não deixe, leitor, de opinar sobre o texto de hoje!
Agradecemos a todos os participantes por se aderirem ao concurso! Tenham um bom dia :D
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