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domingo, 4 de agosto de 2013

[FEITO A MÃO] Escalando aquela colina, Parte I




O primeiro de uma série de contos (quatro ou três partes? Não tenho certeza) que envolvem uma menina com um desejo de ter um amigo e um gato com um segredo incomum :)
Meio inspirado (ao menos, essa parte) em 'Running Up That Hill' do Placebo, então foi a partir dessa música, enquanto eu escrevi essa parte I, que se tem esse título xD







 Escalando aquela colina (I)
 
Paro, chegando a esta soleira, e espio o interior da igreja.
Faz vento úmido nas ruas aqui fora, então acho que é capaz de chover hoje. Pensando nisso, é bom eu ter saído cedo da escola para encontrar este lugar. Imagino o que aconteceria se minhas roupas estivessem encharcadas e viesse para cá, se houvesse muitas pessoas ou alguma missa. Mas, a essa hora da manhã, não tem tanta gente assim.
Vejo uma moça idosa no canto dos bancos de trás, com um terço em mãos e os joelhos apoiados no chão. Apesar da posição, seu rosto se encontra bastante calmo. Há algumas poucas criancinhas que observam curiosas os santos patronos daquela igrejinha. Também tem um senhor já adulto – não idoso e nem jovem – que, em roupas simples, ajeita as decorações florais. E passando solene, mas alegre, há um homem jovial de ‘bom dia’ e ‘como você vai?’.
Retiro o capuz do meu casaco, faço curvada um sinal na direção do altar e adentro.
Quando eu dizia pra mamãe que queria chorar pelo meu estado com meus colegas (quem eu realmente poderia chamar de ‘amigo”?!), além de me sentir cansada em ficar ali sem tentar me recuperar... Ela sempre me dizia que era pra eu ter muita fé, que as coisas dariam certo cedo ou tarde. Só que, apesar de todo o apoio que meus pais e meus outros familiares me dão, sinto muita carência de procurar algo além desse circulo.
Papai e mamãe vão a uma outra, agora maior, e com muitos amigos deles. Mas ultimamente venho sentido mais conexão a esta de estrutura humilde e com pessoas que nem sempre convivem com o luxo. Uma onde houvesse desconhecidos de inicio, sentindo neles um poder que deixava meu coração sossegado e como se todos os sentimentos negativos desaparecessem aos poucos.
Claro que mantenho um olho caso venha perceber algo estranho, só que, até então, não senti segundas intenções que não fossem a de realmente acolher as pessoas...
A primeira coisa que faço aqui dentro é só observar.
Recolho-me para um dos bancos do meio, perto de um homem que admira a imagem de Cristo além do altar de madeira. Bem ao meu lado, há uma imagem de Nossa Senhora, ela apoiada em uma mesa com uma toalha verde rendada a mão.
Espero algum tempo até ver o padre, aquele homem jovem, chegar. Ele me reconhece ao me olhar de perto – sem usar seus óculos costumeiros –, acena e sorri antes que pudesse se aproximar para começar uma conversa.
Não é bem uma confissão, embora sejam sussurros por minhas palavras traduzirem a gama de coisas que aconteceram no dia-a-dia. Não explicitas, mas só me refiro a umas certas situações em que eu quero algum conselho, alguma ajuda que talvez não conseguisse pedir a meus próprios pais.
Ele pega alguns ensinamentos da Bíblia para poder me dar umas orientações, além de dizer que Deus me ajudaria a dar toda a força que precisasse para seguir em frente. Mas que, diante do que acontecia comigo, não posso ficar sozinha. Que eu tenho que ser forte, juntar energia para poder lutar com o que me afrontava e procurar ajuda de alguém. Diz que ele pode se dispor a agir como meu amigo, porém, ‘quem’ é sempre disponível a fazer tal serviço:
“Deus pode te ajudar, se você se sentir sozinha”, é o que o homem me aconselha, “Até ali, você pode tentar também se estabelecer com o apoio que sua família irá te dar, principalmente seus pais que amam você. Mas Deus, os intercessores dele, nossa mãezinha e o nosso irmão Jesus Cristo, assim como os anjos que estejam a protegendo, podem ser seu apoio enquanto você não ache mais quem possa fornecer momentos de felicidade e retribuí-los também”
Vão-se mais algumas palavras, minhas e dele, da conversa até eu descobrir agora que está na hora de ir embora. Cumprimentamos um ao outro, ele acena ‘Deus te acompanha’ e aceno com um sorriso, até minhas pernas voltarem para a soleira da porta. Isto se não fosse um rápido pensamento que esqueci alguma coisa, o que me faz virar meu rosto em uma direção.
Ali, encontra-se a imagem de Nossa Senhora. E, em suas mãos, uma do Menino Jesus.
Há um momento de aparente telepatia. Ou de uma estreita ligação espiritual, não se sabe. Só sei que, por alguma razão que nunca vou conseguir explicar (mas que sinto), é a deles terem me ouvindo bem e de terem me dado um pouco de atenção. Não sei realmente se disseram algo no meu ouvido, ou na minha cabeça, só que, de repente, sinto um fluxo de tranquilidade e bondade com esse gesto.
E é com essa sensação que viro, curvo para o altar e saio.
Entrando nos ares da cidade, faz minha mente ficar imaginando enquanto o tempo, sempre apressadinho, não para mesmo se eu pedisse ‘por favor’. São prédios altos com detalhes de época, praças com bancos brancos e árvores douradas, cachorrinhos na rua, pontes com vista de rios meio poluídos, quintais com flores com cores brilhantes, moças com bebês fofos e birrentos, pessoas trajando vários símbolos, céu com nuvens meio carregadas e...
Viro para a direita.
...essa placa da rua aí. Paro próxima dela, olhando ao redor. Pelo que bem me lembro (se minha memória não é tão falha assim), eu poderia encontrar um ponto de ônibus próximo daqui. Aqui no canto, no encontro entre duas ruas, tento ver. Mas não há nada – apenas o muro de uma escola, uma das mais prestigiadas (pelos mais velhos), e uma calçada com algumas pessoas andando. Não vejo nada de diferente, pois elas possuem sombras, o resto das coisas não parecem estranhas e está ainda um dia nublado.
Só que... Juro que havia um ponto de ônibus bem aqui! E nem queria ir andando para minha casa, por ela ser bem longe... Sentindo-me um pouco mais desanimada, vou pela direção perpendicular. Atravesso a rua, indo perto de uma loja de um senhor que vende chaves e ando por baixo da sombra que a cobertura faz. Vrum-vrum, consigo ouvir carros direto enquanto faço meus passos por essa trilha de concreto. Ando por mais algumas lojas e casas, até chegar ao portão de um estacionamento que cruza meu caminho para o próximo ponto.
— Como você ousa tentar arruinar meus cactos, seu miserável?!
Paro para verificar o que está acontecendo. Acho que pode ser algum inseto sobrevoando o quintal de alguma senhora... Mas então vejo que não é bem o que imaginava. É só uma mulher morena correndo atrás de um gatinho magrelo. E ela está com uma vassoura na mão enquanto ele está... Ao ver isso, sinto que devo ter o visto em algum lugar. Falando nisso, não há sempre um gato perambulando por estas bandas na procura de comida?
E logo vejo que o gato possuía um lacinho amarelo que envolvia a extremidade da cauda. Percebo, assim, que eu o conhecia. E vejo alguns arranhões pelo corpo e o animalzinho se tremendo todo, tadinho. Olho ao meu redor e não vejo ninguém fazendo algo pelo felino. Só observando, enquanto a senhora se apressava ainda mais enquanto o outro tentava escapar sob gemidos de dor. ‘Ninguém vai tentar ajudar?’, é o que me pergunto, antes de perceber que nenhuma das outras pessoas se preocupava com o pobre animal.
Tenho que intervir. Esse pensamento se fixa em minha mente como um adesivo. Dou alguns passos na direção da senhora, que já ia tacar novamente no pequeno. E então, ao notar minha presença, ela se vira para mim com seus olhos meio vermelhos.
— O que é que você quer? — a mulher me olha feio. — Não vê que tô ocupada com esse malandro, menina?
— É que... — sinto minha voz tentar desaparecer, antes que meus olhos procurem o felino. — Eu acho que este é meu gato desaparecido, senhora. Eu tinha um gato igualzinho a esse um ano atrás, só que ele sumiu de casa. — e noto que ele também me olha.
A senhora abaixa a vassoura, com um olhar bastante desconfiado. A moça diz nada antes de dar meia volta, vendo que o gato permanecia parado a alguns metros do meu pé, adentrar em sua residência, fechar o portão e apontar diretamente pra o menor como se o alertasse para não chegar perto dela novamente. E então, eu a vejo desaparecer.
Demora um tempo, parada aqui, para eu notar o corpo vivo ao meu lado. Os olhos dele me contemplam antes da boca miar baixinho, sem forças. Começo a pensar em dizer a ele (ou ela? Talvez seja uma fêmea, quem sabe?) que meus pais não gostam de nenhum animal em casa, mas não consigo também ter forças ao ver os machucados de perto.
Continua...

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4 comentários:

  1. Mas que triste Lu! E uma gracinha também, haha. Amei!

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  2. Tem uma certa tristeza

    Beijos
    @pocketlibro
    http://pocketlibro.blogspot.com

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    Respostas
    1. hahaha. concordo -q (meio cruel eu rir enquanto tem tristeza, mas depende)
      valeu por ler :)

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